Prestes a completar 50 anos de carreira, iniciada como cantor de boleros, Raul Gil se prepara para mais uma final de seu disputado concurso de calouros. Simpático, o animador — como faz questão de frisar, não é só apresentador, porque “canta, dança, conta piada” — recebeu a TV TDB! nos bastidores de seu ‘Programa Raul Gil’, na Band. Falou de audiência, colegas de profissão e da mão boa para descobrir talentos — os mais recentes foram o fenômeno Ricky Vallen e a prodígio Maisa Silva, motivo de mágoa após sua ida ao SBT.
Entre dezenas de camisas, ternos e gravatas, Raul Gil aguarda o início da atração que comanda na Band desde 2005. Um séquito de mulheres faz suas unhas, cabelos, separa as opções de roupa no camarim. “Ele é vaidoso, se preocupa muito com o cabelo”, confidencia a secretária da família, Neide Montoni. Os reluzentes anéis e pulseiras entregam: Raul gosta de ouro, muito ouro. “Pareço até o Aguinaldo Timóteo”, brinca.
No começo da década, Raul reinava absoluto nas tardes de sábado, na Record. De lá saíram artistas como Edson & Hudson (“Cansamos de oferecer a dupla para a Hebe, Gugu, Faustão, ninguém queria”), Gian & Giovani e Robinson Monteiro. O sucesso despertou cobiça. “Fui convidado pela Globo em 2003. Dava ‘cacetada’ aqui em São Paulo no ibope do Luciano Huck. Queriam fazer um contrato, mas não aceitaram uma das cláusulas”, diz. Raul queria se resguardar de uma ‘inesperada’ troca de horário. “Disse: ‘Serginho Groisman está fazendo programa de madrugada, amanhã vocês (a Globo) me jogam às duas da manhã e não vou gostar’. Ficou por isso mesmo”, dá de ombros.
Hoje Raul continua descobrindo talentos — as inscrições, abertas a cada dois anos, chegam a seis mil pessoas —, como o cantor Ricky Vallen e a pequena Maisa — que cantava em seu programa e foi levada, na surdina, por Silvio Santos para o SBT. “Foi uma surpresa quando meu filho avisou que era o último dia da Maisa porque ela tinha assinado com o Silvio, gravei chateado”, lembra.
“Maisa era nossa contratada, ganhava R$ 2 mil. Depois de três anos, a mãe dela disse que o próprio Silvio ofereceu programa e R$ 20 mil por mês”, conta Raul Gil Jr., diretor do programa e da gravadora Luar Music, criada para administrar a carreira dos novos astros. Ficou a mágoa. “Nunca mais vi a Maisa. O estilo que o Silvio faz não é o dela. ‘Oi Maisa, Maisa, Maisa’ (imita Silvio), ele assusta! Quando a Maisa fazia alguma coisa, eu dava uma de criança com ela”, lembra o animador, batendo os pés.
Simony, estrela-mirim dos anos 80 com o Balão Mágico, também foi sua descoberta. “Ela tinha 3 anos, dei sua primeira bicicleta. Um dia a mãe e o tio chegaram com contrato da Globo: ‘Seu Raul, eles querem fazer um grupo infantil com a Simony. Mas se o senhor disser que não, a gente não assina’. Eu disse ‘Vai’”, conta Raul, que abriu novas inscrições para talentos infantis recentemente.
A saída do intérprete de ‘Vidro Fumê’ foi amigável. “Ricky saiu bem, temos que dar força para ele ser o grande cantor que é, verdadeiro showman. Mas tivemos que lapidá-lo, ele vinha com uns bailarinos, vestido de mulher...”, lembra. O cantor de Volta Redonda foi indicado ao Grammy Latino em 2007, como revelação. “Levei o Ricky, dei dinheiro para ele comprar presente para todo mundo em Las Vegas”, conta o filho Raulzinho.
Nem sempre é assim. “Tem calouro que acha que não precisa mais do programa. O cara vem lá do fim do mundo de ônibus, encara 60 horas de estrada. Quando vejo que é bom, pago passagem de avião. Aí chega aqui e logo aparece um empresário”, reclama Raul.
O formato tradicional do programa dá resultado, ao contrário da concorrência. As edições do finado ‘Fama’, na Globo, não fizeram ídolos — salvo Thiaguinho, que foi para o Exaltasamba, e Roberta Sá, mais conhecida no Rio. Mesmo o ‘Ídolos’, hoje na Record, ainda não chegou lá. “Meu programa abriu portas. Sidney Magal, Metrô, Titãs, Ultraje a Rigor, É O Tchan — ainda como Gera Samba — Katinguelê, todos começaram lá.”
Muitas joias e coleção de carros de luxoRaul Gil não é de muitos luxos, mas gosta das boas coisas da vida. Além das joias, mantém outra coleção de alto valor. “Tenho uns carrinhos...”, define. Por ‘carrinhos’ entenda-se dois Jaguar, um Maserati, um Porsches e dois BMW, entre outros possantes. “Tenho uma Harley-Davidson que é única no Brasil”, vibra. Nas horas vagas, aproveita sua chácara em Itu, interior de São Paulo, com quadra de tênis e futebol. “Gostava de jogar uma bolinha, mas começou a morrer ‘nego’. Eu, com 71 anos, já viu, né?”, diverte-se.
O famoso microfone dourado é mesmo de ouro, feito exclusivamente para ele. Fica guardado na Band. “Foi presente da (gravadora) WEA mundial. O ‘Programa Raul Gil’ tinha vendido mais de 2 milhões de CDs de Robson Monteiro, Rinaldo e Liriel, Leilah Moreno, o time de 2001”, conta Raulzinho. Sinal dos tempos, hoje o campeão Ricky Vallen vende 80 mil, ótima marca para o mercado.
‘Sou igual a bicicleta: se parar, caio’O quadro ‘Para quem você tira o chapéu?’, clássico de Raul Gil, está fora do ar porque os convidados evitavam se expor, só falavam de temas que não os comprometessem. Raul tira o chapéu para seus colegas de profissão. “Gosto do Gugu, que passou a ser conhecido quando era meu jurado. Gosto do Faustão pela forma de levar o programa. Sou muito fã do Silvio. Rodrigo Faro, na Record, está batalhando, né? Devagar está se adaptando, como o Marcio Garcia (que também fez ‘O Melhor do Brasil’), que foi muito bem”.
Ele volta a falar sobre o dono do Baú. “É o maior apresentador do País. Meu estilo é próximo ao do Silvio, apesar de não imitá-lo. De vez em quando ele faz umas coisas que eu faço, como conversar com crianças, sentar no chão, ajoelhar — coisas que não fazia”, alfineta Raul, que não entrou na ‘pilha’ quando Silvio Santos o chamou de gay no ‘Pânico na TV’. “Tudo o que eu sou, tudo o que aprendi na vida, foi com ele”, ri.
Chacrinha é capítulo à parte. Raul passeava no Fusca branco do Velho Guerreiro pelos subúrbios da Rio. “Ele era muito engraçado. As pessoas acenavam e ele mandava: ‘Alô, meu filho, vai para PQP’. Perguntava por que e ele ria: ‘Eles não estão ouvindo’. Adorava o Chacrinha'.
Volta e meia, Raul imita o amigo. “Dona Florinda (viúva de Chacrinha) liga quando brinco no programa. Ela chora”, conta Raul, que cita o Velho Guerreiro quando perguntado sobre aposentadoria. “Chacrinha dizia ‘O homem é como a bicicleta: parou, cai’. Não posso parar.”
FONTE: O Dia.